Grande Entrevista: Prof. Henrique Garcia (2ª Parte)

Nesta semana concluímos esta grande entrevista focando novos temas, como o Projecto Nestum e os Grupos Equipas do Desporto Escolar e voltando a tocar em alguns que, apesar de já abordados no artigo da semana passada (a primeira parte), também estiveram presentes durante esta longa conversa com o Prof. Henrique Garcia, que agora retomamos. Não queremos terminar este longo artigo sem agradecer ao Professor a sua colaboração e disponibilidade, aos nossos visitantes pela

Índice da Segunda Parte:
- Estágios das Selecções Sub16
- Desafios para o futuro do Rugby Juvenil
- Projecto Nestum
- Grupos Equipas do Desporto Escolar
- Tag Rugby e Touch Rugby
- Beach Rugby


7 - Rugby Portugal (RP): Abordando os Sub-16, nomeadamente a Selecção Nacional do escalão e os estágios que, desde a época passada, se têm realizado, que nos pode dizer sobre a forma como têm decorridos os estágios e sobre a representatividade (em termos de clube de origem) dos atletas convocados, numa primeira fase, às selecções regionais, e posteriormente, à selecção nacional do escalão?

7 - Prof. Henrique Garcia (HG): "As captações nos Sub-16 foi algo que iniciámos porque é importante captar e começarmos a reter alguns talentos, que já são visíveis. Numa primeira fase, envolvemos quase 200 atletas, divididos pelas cinco selecções regionais (uma no Norte, outra no Centro, duas na Grande Lisboa e uma no Alentejo/Algarve) e tentámos ver o maior número de atletas possível.
Depois preocupamos-nos em seleccionar os jogadores tendo em atenção factores como a morfologia (a altura e o peso), muito importantes no processo de selecção, sendo que ao mesmo tempo tivemos a atenção de não colocar de lado aqueles atletas que já demonstravam possuir índices técnicos/tácticos acima da média. Conciliar estes dois factores foi a principal dificuldade desta fase de selecção.
O trabalho decorreu de uma forma muito positiva, ao ponto de, nas várias regiões, os treinadores quererem prolongar o trabalho das Selecções Regionais durante os meses de Janeiro e Fevereiro. Não foi possível, porque não estava orçamentado e previsto para 2010, mas é um dos aspectos que nesta temporada vamos tentar que aconteça. Assim, os jogadores que não forem para a Selecção Nacional de Sub-16 continuam a treinar a este nível mas com as Selecções Regionais. Outra das ideias que queremos por em prática tem a ver com um segundo encontro de selecções regionais. Assim voltamos a ter um primeiro encontro em Dezembro e depois teremos um segundo encontro em Junho, no fim da temporada.
Tentámos, em termos de representatividade, inserir atletas de todos os clubes, e todos eles se mostraram interessados em ter jogadores presentes pelo menos na fase regional. A partir daí coube aos treinadores a escolha dos jogadores. Penso que da parte dos jogadores, esta foi uma experiência positiva, que eles gostaram de ter, os próprios treinadores estiveram muito entusiasmados com o encontro de selecções regionais, que acabou por correr muito bem. Vamos agora tentar dar um segundo passo neste projecto, para que em 2010/2011 continuemos a trabalhar com as selecções regionais durante todo o ano, envolvendo ainda mais treinadores e jogadores, terminando a época com o segundo torneio regional."


8 - RP: Continuando dentro do tema das selecções queremos perguntar-lhe quais considera serem os principais desafios do rugby juvenil no nosso país, depois de a nossa selecção nacional sénior ter ficado afastada do próximo Mundial, prevendo-se com isso uma diminuição do interesse à volta do desporto em Portugal?

8 - HG: "Eu acho que este ano de 2010/2011 vai ser um ano muito importante. Tenho uma opinião sobre este assunto, uma ideia daquilo que poderá acontecer, em termos do rugby juvenil, e não sou nada pessimista, bem pelo contrário.
Nós se conseguirmos dar continuidade aos projectos que temos vindo a desenvolver até aqui, se conseguirmos dar mais qualidade e melhorarmos alguns destes projectos que suportam o rugby juvenil, estamos a falar da organização de competições, do material técnico e didáctico que tem sido produzido e será produzido, do investimento nas Escolas de Jovens Árbitros, na formação de treinadores, se tudo isto continuar a ser desenvolvido e, mais do que nunca, com qualidade, eu penso que nós vamos continuar a crescer não só no rugby juvenil como também nos outros escalões.
Outro aspecto que me parece importante destacar esta relacionado com esforços desenvolvidos para permitir que o rugby possa ser jogado por TODOS, para isso temos apoiado a criação de escolinhas de rugby inseridas em bairros carenciados, muitas delas já iniciaram actividade e estão em fase de consolidação. Esperemos recolher os frutos deste trabalho nos próximos anos.

É evidente que se nós começarmos a "facilitar" em algumas desta áreas, não estaremos protegidos pelos resultados e mediatismo da Selecção Nacional, mas teremos sempre o desafio de chegar ao fim do ano e ver se o número de atletas cresceu, estagnou ou diminuiu. Fazer um balanço e avaliação no final da época tem sido fundamental para traçar novos objectivos e corrigir os projectos com menos sucesso. Acredito sinceramente que é possível continuar a crescer!”


9 - RP: Não podíamos terminar sem abordar a Festa Final do Projecto Nestum e as Finais Nacionais do Desporto Escolar em 2009/2010. O Prof. Tomaz Morais falou em números sem precedentes em termos do rugby juvenil português.

Que nos pode dizer do mega-evento que se realizou na região bairradina e até que ponto é importante para o futuro da modalidade em Portugal estes milhares de jovens terem praticado rugby neste nível? Acredita que podemos contar, no futuro, com Lobos que começaram a jogar nos Grupos Equipa do Desporto Escolar ou que se iniciaram no rugby graças ao Projecto Nestum Rugby nas Escolas?

9 - HG: "Penso que o Rugby Escolar tem todas as condições para ser um projecto que vai ajudar o desenvolvimento do rugby em várias áreas, nomeadamente a massificar o jogo, dando-o a conhecer às crianças e jovens, sendo que a partir daqui podem acontecer duas coisas: a criança conhece o jogo, gosta e procura um clube, fica a conhecer o jogo e, mais tarde, experimenta jogar num clube; ou fica simplesmente a conhecer o jogo e retira daí aquilo que são alguns dos valores que o rugby tem para transmitir, o que só por si, é de grande importância.
Depois temos que abordar algo que nós estamos empenhados em fazer, proceder à ligação entre o Projecto Nestum, o Rugby Escolar e os Clubes, tudo isto tem que estar de mãos dadas. Aqui é importante os clubes perceberem a grande mais valia que pode ser o facto de as escolas da região terem o Projecto Nestum. Se calhar na Grande Lisboa isto não é algo que acontece de forma clara, porque os clubes desta região já tem muitos jogadores, mas fora da região de Lisboa, e nomeadamente em algumas zonas, este projecto pode ser decisivo, eu vou dar dois exemplos.
Falo primeiro do Montemor, pois todos nós sabemos o crescimento que nos últimos três anos o clube tem tido, fruto de uma boa organização interna e de uma aposta clara na introdução do rugby nas escolas, tudo factores que fizeram com que o Rugby Clube de Montemor crescesse, e de que forma, em número de atletas. Estamos a falar de Tag Rugby, praticado no primeiro ciclo (3º e 4º ano) e no segundo e terceiro ciclo (5º e 6º ano e 7º ao 9º ano, respectivamente).
O outro exemplo é o do Moita Rugby Clube da Bairrada, que com a introdução do Projecto Nestum na EB 2-3 e no primeiro ciclo teve um crescimento assinalável. Este clube, tal como o Montemor, tem uma equipa feminina, mostrando que o Tag Rugby, um jogo que pode ser praticado tanto por raparigas como por rapazes, também potencia o aparecimento de tanto rapazes como raparigas no rugby de clubes. Os clubes têm que ir com a federação às escolas, fazer divulgação do projecto, do seu clube e da sua organização, para que exista uma ligação entre as duas partes.

Ainda é cedo para termos internacionais que tenham praticado o Rugby no Projecto Nestum ou nos Grupos Equipa do Desporto Escolar, mas já temos a noção que alguns atletas vão chegando aos clubes dessa forma, isto é algo que já acontece. No futuro, é esse o objectivo, estabelecer uma melhor transição entre o Projecto Nestum, os Grupos Equipa e o rugby de clubes.
A Festa Final do Nestum Rugby foi um sucesso, um verdadeiro espectáculo, pois creio que muita gente em Portugal que está ligada ao rugby não acreditaria que é possível ter tantos alunos a jogar rugby no meio escolar, mais de 900 alunos a jogar rugby, a representar 70 escolas, algumas com um nível de jogo, nomeadamente no Tag Rugby, muito interessante, em que as principais dominantes técnicas (o passe, a finta, o 2 contra 1, por exemplo) completamente adquiridas, com muitos jogadores para quem este já é o segundo ano de participação.
Em relação aos Grupo Equipa do Desporto Escolar, eu creio que nos últimos cinco anos a fase final do Grupo Equipa teve apenas duas equipas a disputa-la. Este ano, tivemos o número máximo permitido de seis equipas (no sector masculino), e tivemos três equipas (que depois passaram a ser duas) no sector feminino a competir na fase final dos Campeonatos. Nos rapazes o campeonato foi muito disputado, muito interessante, dois dias de prova em que cada equipa fez sete jogos, com o nível de rugby a ser muito interessante de observar, tendo os professores das escolas participantes referido o salto qualitativo que a prova deu.

Queremos, e estamos convictos que vai ser possível, conjugar algumas competições dos Grupos Equipas com o Circuito Nacional de Rugby de Sete em Sub16 e Sub18 em 2010/2011. É possível, pelo Desporto Escolar (o seguro permite-o), que os Grupos Equipas (estamos a falar de atletas entre os 13 e os 17 anos) compitam contra Clubes no Circuito Nacional de Sevens dos mais novos." Vai ser uma excelente experiência e vai aproximar os clubes escola dos clubes federados.”


10 - RP: Para esclarecer quem não conhece ainda muito do rugby juvenil, pode ajudar-nos a distinguir o que é o Projecto Nestum e o que são os Grupos Equipas do Desporto Escolar?

10 - HG: "São duas coisas completamente diferentes. O Projecto Nestum é um projecto especial, em que as escolas se inscrevem no início do ano. A inscrição implica que a escola receba formação dos professoras, um kit com material para desenvolver o Tag Rugby mediante um compromisso de estas instituições participarem nos torneios inter-escolas do projecto. Aquilo que com o P.Nestum pretendemos é semear e motivar as escolas para a prática do rugby.

Com os Grupo Equipa, estamos a falar de outro assunto totalmente diferente, as escolas, no seu projecto do Desporto Escolar, candidatam-se a ter uma serie de actividades regulares de natureza desportiva (por ex: equipa de andebol, basquetebol, natação). Existe um professor que vai ficar responsável por cada um destes grupos equipa, é atribuída ao professor 4 horas para desenvolver a modalidade, com dois treinos semanais e competição ao fim de semana ou à 4ª feira.
Este ano conseguimos organizar uma competição nacional com estas escolas, estiveram em actividade um total de 25 equipas a nível nacional. Para isso contribuiu o apoio dado pelos técnicos das associações, que deram formação aos professores e colaboração na organização das competições inter-escolas.

Dentro do Projecto Nestum, encorajamos as escolas a, se estiverem interessadas, formarem um Grupo Equipa, pois dentro do grupo equipa, aquilo que estamos a incentivar é a prática do rugby de sete, jogado a campo inteiro ou a meio campo, conforme o número de equipas participantes em cada torneio."


11 - RP: Agradecemos-lhe a sua disponibilidade e concluímos falando um pouco de várias variantes sobre as quais ainda não existe muita divulgação mas que são consideradas as bases do Rugby de Promoção: o Touch Rugby, o Tag Rugby e o Beach Rugby.

Que nos pode dizer sobre o estado actual da prática destas variantes em Portugal e sobre as suas diferenças e potencial para contribuírem de forma significativa para levar o desporto da bola oval a novos espectadores e, esperamos todos, novos praticantes?

11 - HG: "Em relação ao Touch Rugby esta é uma modalidade que está a ter imensa expansão a nível internacional em países como a Inglaterra, a Austrália e a Irlanda, por exemplo, e possui uma federação internacional autónoma, sendo algo que tem o seu espaço, porque permite que ex-jogadores possam continuar a sua prática, permite que pessoas que nunca jogaram rugby rapidamente possam jogar rugby, porque a componente de contacto não existe, é uma variante que a curto/médio prazo vai ganhar expressão em Portugal.
Existe um grupo de pessoas muito interessado em promover o Touch Rugby e a Federação vai supervisionar e acompanhar esse trabalho. Não pode ser uma prioridade da federação mas é algo que federação acredita que é um excelente meio de desenvolvimento do rugby. A curto prazo teremos algumas iniciativas mais oficiais de apoio ao Touch Rugby, nomeadamente com o apoio de organização do I Torneio de TR em Portugal e com uma ou outra acção de divulgação.

Em relação ao Tag Rugby, é preciso compreender que esta é uma forma atractiva de introduzir o rugby nas escolas. Nós tivemos algumas dificuldades iniciais porque já existia o Bitoque Rugby, muito semelhante ao Touch Rugby, mas a adesão e a forma como os professores e os alunos receberam o Tag fizeram com que avançássemos com esta variante para nas escolas dinamizar e introduzir de forma massiva o jogo.
Isso não quer dizer que o Tag Rugby não pode ser usado como forma de promoção, como forma de organizar uma actividade lúdica para um grupo de pessoas que queira aprender a jogar rugby (por exemplo, os Pais e Mães), isso não está posto de parte. Todavia, estamos claramente a levar o Tag Rugby para uma forma muito inicial de aprendizagem e para o rugby escolar, o Touch Rugby para um grupo de pessoas que queira de forma mais regular participar em algumas competições, para ex-praticantes que consigam aglutinar outras pessoas no caminho para o rugby de sete e para o rugby de quinze.

O Beach Rugby é uma excelente forma de promoção do rugby. No verão estão sempre milhares de pessoas nas praias portuguesas e é uma excelente forma de promover o jogo, sendo que por outro lado é uma altura da época em que continua a ser importante que os jogadores se mantenham activos, em que os jogadores mais novos aproveitem o Beach Rugby para se inserirem nas equipas seniores.
A nossa ideia é regular o Beach Rugby de forma não autónoma, isto é, regular a competição, tentar ter um Campeonato Nacional consistente, mas deixar que estes eventos sejam geridos ou por Clubes, em primeiro lugar, que é o que nos interessa mais, ou por entidades privadas, que queiram organizar eventos de Beach Rugby."