Match Report - Lousã 'B' v GRUFC/CENATEX (Seniores, Domingo, 21 de Março, 15:30)

O quarto "Match Report" do Rugby Portugal em 2009/2010 (leiam aqui os outros artigos desta rubrica), é, no mínimo, um artigo invulgar. Num fim-de-semana repleto de grandes jogos, pareceu-nos importante destacar um encontro entre um clube novo e diferente do habitual da comunidade nacional, o GRUFC/CENATEX (ou Guimarães), e um histórico do rugby português, a Lousã, que recebeu na sua casa, o Campo de Santa Rita, uma partida a contar para o Campeonato Nacional da Segunda Divisão Sénior.

O vosso autor deslocou-se até à região Centro para prestar homenagem a um grupo de atletas, técnicos e jovens praticantes, para acompanhar um pequeno pedaço do crescimento de uma nova entidade, um emblema que do nada se fez notar e estabeleceu, numa cidade que nunca tinha ouvido falar da modalidade, que nunca teve contacto com o desporto da bola oval... até agora.

O principal indicador de que este jogo valia a pena cobrir não veio da disposição das equipas (bastante diferentes, como verão), ou da importância desta partida para os clubes em questão (não era a partida do ano para ninguém), ou até da simpatia e profissionalismo com que os responsáveis do Guimarães (em especial o Sr. Eládio Ribeiro, na parte da comunicação social, que espero que me perdoe pelo horrendo atraso na publicação do artigo) têm abordado, numa modalidade marcada pelo amadorismo, a sua actividade, mas sim de um pequeno pedaço de papel, uma etiqueta da camisola que gentilmente me ofereceram, algumas linhas que resumem o espírito e a alma de um clube, por mais novo que seja, por mais estranho que pareça a quem, do alto de alguma hipotética hierarquia, ainda vê o rugby como uma modalidade de classe e não aberta a todos, umas linhas que dizem o seguinte:

"Este é o teu equipamento oficial GRUFC. Foi criado com o orgulho e a paixão de quem vive o Rugby. Antes de o vestires, inspira-te e pensa: Terei a coragem? Terei a dignidade? Terei a disciplina? Terei a ética? Ainda assim, serei digno de o usar? Se o és, então atreve-te e veste-o com o orgulho de um verdadeiro jogador de Rugby."

Assim se explica porque neste Domingo, a 21 de Março, nos deslocámos até à Lousã, para realizar uma reportagem que peca por tardia, pois no nosso entender, clubes como estes, quer sejam mais recentes ou nomes já conhecidos da comunidade nacional, fazem, nesta altura de maior dificuldade, agora que o sonho do Mundial de 2011 ruiu, toda a importância e diferença entre o futuro para a nossa modalidade que gostaríamos de ter e aquele que, se não formos solidários com quem trabalha bem e se esforça em prol do rugby nacional, pode vir a transformar-se numa (dura) realidade.


LOUSÃ 'B'
01 - Sérgio Alves
02 - Rui Rodrigues
03 - João Serra
04 - Mauro Fulgêncio
05 - Felipe Paiva
06 - José Costa
07 - Paulo Cruz
08 - Paulo Nogueira
09 - Pedro Costa
10 - João Quaresma
11 - Roger Neves
12 - Carlos Calçada
13 - Tiago Graça
14 - Nuno Alves
15 - José Costa
TM - António Janeiro
16 - João Santos
17 - Nuno Cadete
18 - Carlos Gonçalves
19 - Bryan Antunes
20 - Jorge Simões
21 - Francisco Janeiro
22 - João Brundel
23 - Nuno Leitão Santos


GRUFC/CENATEX
01 - Eládio Ribeiro
02 - José André Freire
03 - Luís Ferreira
04 - Lionel Azevedo
05 - Luís Silva
06 - Henrique Novais
07 - André Abreu
08 - Nuno Cardoso
09 - André Mendes
10 - Tiago Miranda
11 - Jorge Silva
12 - David Abreu
13 - Graciano Mendes
14 - Luís Teles
15 - Manuel Machado
TP - Francisco Fragateiro
18 - Hugo Gonçalves
21 - Carlos Alberto
22 - Márcio Freitas
TM - Luís Martins


PRIMEIRA PARTE (19-00)

A partida começou de forma bastante equilibrada, com os avançados de cada lado a assumirem grande parte das despesas do jogo. Perto dos cinco minutos de jogo, o XV da casa, da primeira vez que abriu a bola, obteve um ensaio à ponta, ensaio esse que o chutador serrano viria a converter (07-00).
Nesta fase inicial notou-se que o Guimarães recorria menos aos três-quatros nas movimentações ofensivas, manifestando também dificuldades na defesa, demorando a alongar a sua linha e cobrir o espaço livre eficazmente, um factor que se notou aquando do primeiro ensaio do Lousã.
Por outro lado é importante destacar que os avançados da cidade berço surpreenderam ao lutarem de igual para igual (superiorizando-se esporadicamente) com o pack avançado da casa. A progressão fazia-se muito pelo jogo à mão, num estilo algo redundante pois a bola saia pouco das mãos dos avançados, sendo o jogo ao pé raramente utilizado.
Estando metade da primeira parte decorrida, a Lousã marcou o segundo ensaio, este não convertido, ampliando no marcador uma vantagem que era bem visível no terreno de jogo. No que concerne ao estilo do rugby praticado, foi interessante constatar que as equipas abriram um pouco o jogo, não conseguindo, regra geral, obter situações de grande perigo com isso mas tornando, não obstante, a partida bem mais atractiva para os espectadores presentes no Campo de Santa Rita (12-00).
Uma nota para os alinhamentos e formações ordenadas, situações em que assistimos a um equilíbrio constante desde o início do encontro, que agora era mais disputado no meio campo do GRUFC, com os visitantes mais empenhados em aliviar a pressão causada pela equipa serrana, recorrendo com maior frequência aos pontapés para recuperar terreno e evitar o terceiro ensaio.
Até ao intervalo, a Lousã, apesar do bom esforço defensivo dos atletas nortenhos, voltou a causar estragos com os seus três-quartos (e por estragos queremos dizer um terceiro ensaio, este convertido), deixando os vimaranenses com um resultado ao intervalo que podia (e seria) ser rectificado na segunda parte (19-00).
Faltavam pontos à turma visitante naquilo que foi uma exibição segura por parte dos homens da casa, equilibrando o confronto com os fortes avançados do GRUFC e sendo muito eficaz quando se tratou de abrir a bola para as linhas atrasadas, claramente superiores em comparação com os três-quartos dos visitantes, muito confinados a tarefas defensivas.


SEGUNDA PARTE (12-03)

O segundo tempo mostrou um Guimarães diferente, mais ofensivo. Os Bravos voltaram do balneário mais agressivos, abrindo verdadeiramente o seu jogo, tentando criar ocasiões para os três-quartos atacarem a linha de ensaio. Os três pontos do GRUFC, obtidos neste parte inicial, via conversão soberba de uma penalidade (frontal, mas a menos de cinco metros da linha do meio-campo), deram-nos a primeira indicação de que, enquanto houvessem pernas e capacidade para acreditar, o XV visitante não desistiria do ensaio (19-03).
Nesta altura é apropriado saudar a dedicação e experiência do conjunto serrano que, misturando atletas Sub-18 e Seniores, homens que, ano após ano, apesar dos problemas inerentes à prática de desporto por estudantes e tendo em conta as dificuldades em conciliar uma vida profissional, familiar e as exigências do rugby, continuam a vir treinar e jogar por esta equipa B do RC Lousã, mostrando um amor ao clube e à modalidade no mínimo de louvar.
Este reconhecimento vem na sequência da resposta do conjunto da casa, que assumiu (novamente) o controlo da partida, conseguindo, com grande fatia da posse de bola e do domínio territorial, assegurar que os esforços dos vimaranenses não dariam mais frutos, isto tendo em conta a profundidade da equipa lousanense, bem mais experiente e numerosa (os Bravos só tinham três suplentes e muitos dos seus atletas ainda estão a dar os seus primeiros passos no desporto).
O jogo estava agora mais aberto, dividido não só no que às situações estáticas diz respeito (ex. melées e alinhamentos, pese embora ligeira vantagem dos visitados neste último aspecto) mas também no que concerne aos erros de 'handling' (ie avants, erros no passe), responsáveis pela esmagadora maioria das faltas assinaladas pelo árbitro da partida, que naquela tarde teve um trabalho relativamente tranquilo (pese embora não ser o elemento designado pela FPR, uma falha a registar).
Com as sucessivas substituições dos dois lados e o tempo nesta segunda parte a passar, o sentido do jogo viria a alterar-se definitivamente, estando o Guimarães agora mais remetido para funções defensivas, tentando evitar o quarto ensaio dos da casa e contra-atacando quando tinha hipótese de o fazer. Da parte da Lousã, salientamos a boa boa exibição dos avançados, que conseguiram controlar as situações em que o pack visitante se superiorizava e, nos três-quartos, do abertura João Quaresma, no centro Tiago Graça e no nº16, João Santos, três jovens que estiveram particularmente interventivos no desenrolar da partida e que realizaram exibições muito interessantes.
Nunca é tarde demais para destacarmos também três elementos do conjunto visitante que realizaram uma partida muito boa e cuja importância para o desempenho do XV foi bastante grande: o pilar nº3, Luís Ferreira, o abertura Tiago Miranda e o nº15, o arrier Manuel Machado, estes dois últimos muito interventivos durante a segunda parte, tentando retirar o jogo (com relativo sucesso) do meio campo (e da área de 22) do GRUFC/CENATEX.
Falámos acima da importância da experiência e das substituições no desenrolar deste segundo tempo. No desfecho da partida notou-se muito a superior experiência e capacidade dos jovens atletas da casa, algo reforçado em especial pela entrada (para nº08) do jovem internacional Albertino Santos, autor do quarto ensaio do Lousã (ensaio convertido) e fazendo muito a diferença no choque com uma já de si desgastada avançada do norte (26-03).
Estando o resultado final há muito tempo decidido, pois a vitória do Lousã B nunca nos pareceu em causa, foi uma pena não termos assistido ao ensaio do Guimarães, aquilo que seria um justo prémio para uma exibição positiva, mas que infelizmente não foi obtido, não se encerrando este encontro sem que os homens da casa conseguissem mais um ensaio, o quinto, fechando o marcador numa vitória justíssima, sem contestação, uma partida na qual as duas equipas deram boa réplica, proporcionando a este autor e aos muitos espectadores uma agradável tarde de rugby (31-03).


REACÇÕES

Depois de terminada a partida, foi com surpresa que reparei no bom ambiente que, pese embora o resultado, rodeava o grupo vimaranense, que ouvia atentamente a análise do seu treinador, Francisco Fragateiro.
Assim sendo, depois de nos despedirmos dos nossos amigos da Lousã e de agradecermos aos seus responsáveis a boa recepção que, como sempre, tivemos, fomos falar um pouco com este técnico, numa conversa que gostaríamos de repetir e de ter prolongado mas que desta feita, teve que ser curta.

1. Rugby Portugal: Em primeiro lugar, como achaste que vos correu o jogo?

1. Francisco Fragateiro: "Achei que os jogadores estiveram combativos até ao fim, mantiveram sempre os nossos princípios defensivos, defenderam sempre bem, o que é muito bom."

2. Rugby Portugal: Tinham alguns objectivos específicos para esta partida?

2. Francisco Fragateiro: "Queremos continuar a implementar o nosso modelo de jogo, na componente atacante e defensiva, sendo que os nosso objectivos não eram em relação ao resultado ou ao jogo em especial. Conseguimos fazer muitos 'turnovers', recuperar muitas bolas, e criamos jogadas de ataque, com várias fases. Os nossos contra-ataques correram muitas vezes bem, quando atacamos à mão. Tentamos o jogo ao pé algumas vezes, mas não estava a correr muito bem. Temos muito caminho para correr, temos objectivo para o futuro e penso que estamos no bom caminho."

3. Rugby Portugal: Em relação ao resto do campeonato, que ilações tiram deste jogo?

3. Francisco Fragateiro: "Este jogo decidiu a final entre o 1º do grupo Norte/Centro (a Lousã B) e o 1º do grupo Lisboa/Sul. Nós temos menos um jogo que a Lousã B, portanto este era um jogo decisivo. Se ganhássemos este jogo e o do Marinhense (em atraso) passávamos para a frente da classificação. Assim sendo, já está decidido, vamos jogar a nossa última partida desta fase em casa, o que vai ser muito bom."

4. Rugby Portugal: Em relação a outras equipas, como estão os outros escalões do clube?

4. Francisco Fragateiro: "Nós neste momento temos Seniores, Sub-18 e os Sub-14. Sou-te muito sincero neste aspecto. Creio que nós estamos a criar boas escolas, com boas camadas de formação. Estamos a aumentar os nossos números, graças à nossa política de divulgação. Temos tido uma política de levar às escolas o desporto, divulgar a modalidade. Acreditamos e apostamos no futuro, e somos pro-activos tanto no que diz respeito a acções desportivas como a acções solidárias. Isto porque achamos que é muito importante que o desporto seja parte intrínseca da comunidade vimaranense e dê algo de volta, fazendo, em última análise, parte do panorama desportivo da região."


FOTOGRAFIAS

Lousã 'B' v Guimarães - Bernardo Rosmaninho


NOTA FINAL

Foi muito positivo, num clube que se estabeleceu sozinho, numa cidade que nunca tinha visto o rugby e num grupo em que os atletas pagam para jogar, se sacrificam a nível profissional e familiar tanto quanto o comum jogador de rugby para praticarem a modalidade sem a experiência ou a tradição de longa data de outros emblemas, e estão muito condicionados, quer seja por causa das dificuldades no que concerne a deslocações ou por causa dos treinos e das condições existentes que, na nossa comunidade, nem sempre existem ou são as melhores, ver o orgulho e união dos homens de Guimarães, bem-dispostos e prontos para nova batalha, já na próxima semana. Pode ser que não os visite esta época, algo que lamento enquanto autor, mas fica o registo de um jogo que interessou, bem mais do que pelo resultado, pelo espírito desta jovem equipa e instituição.
Da nossa parte, apesar de estarmos a abordar actividades de um clube que esta temporada temos acompanhado, muito graças ao Europeu de Sub-19, de forma especial, fica presente não só o rugby praticado no Campo de Santa Rita, mas também a recordação da bonita Serra da Lousã, naquela que foi provavelmente a nossa última visita desta época à cidade e ao clube, onde voltámos a ser recebidos por uma personalidade rara no desporto dos nossos dias, um senhor extremamente dedicado ao rugby, empenhado em dar ao seu emblema um futuro melhor, sendo este já um histórico do nosso rugby por mérito próprio ao sobreviver ao êxodo dos atletas-estudantes, por superar, ao longo de mais de trinta anos, as dificuldades inerentes a algum isolamento, à proximidade de Coimbra e resistir aos devaneios de uma comunidade que por vezes se esquece que o rugby existe (e tem de ser fomentado) fora das grandes cidades (e em algumas onde ainda não chegou ou tem presença ainda pequena), o actual Presidente do Rugby Clube da Lousã, o Sr. António Janeiro.